Medicina Antroposófica

O que é


A Medicina Antroposófica é considerada como uma ampliação da Arte de Curar e baseia-se nos conceitos de Rudolf Steiner na visão do Homen em sua evolução física e espiritual.

Não descarta o conhecimento científico do ser humano no âmbito da Anatomia, Bioquímica, Fisiologia, Psicologia e Patologia mas amplia estes conhecimentos quando considera o Homem como fruto da interação de Forças Físicas e Cósmicas.

Denominam-se essas Forças do seguinte modo: Corpo Físico-portador da matéria, Corpo Etérico-portador da vida, Corpo Astral-portador da sensibilidade e Organização para o Eu ou Espírito-portador da consciência. Estas Forças, com suas qualidades e particularidades distintas, interagem e organizam-se num todo, a que chamamos o Homem na sua totalidade.

Quando a interação destas Forças se processa num equilíbrio dinâmico resulta dele o estado de Saúde.

A Medicina Antroposófica amplia os conhecimentos da Patogénese (Pathos-doença, genesis-causa) no sentido do conhecimento do Homem, na sua Salutogénese (origem da saúde).

AMA


Em Portugal, a Associação para a Medicina Antroposófica - a AMA é a instituição responsável pelo ensino, pesquisa e divulgação dessa prática médica.

A imagem do homem


Os conceitos fundamentais - A imagem do homem segundo a Antroposofia

Segundo a Antroposofia, cada elemento, substância e ser vivo à face da Terra fazem parte de um conjunto harmónico que respira como um verdadeiro cosmo vivo. Este cosmo possui um aspecto sensível, visível e mensurável com o qual nos relacionamos através dos nossos sentidos e que compreendemos racionalmente através da nossa ciência académica, mas possui também um conjunto de forças não visíveis, o seu aspecto imaterial ou supra-sensível. Para a Ciência Espiritual de Rudolf Steiner esse campo supra-sensível é tão real e passível de ser estudado quanto o mundo material. O ser humano ocupa uma posição muito peculiar dentro dessa cosmovisão. Ele é considerado uma imagem condensada desse mundo ao seu redor. Um microcosmo em permanente interação com o macrocosmo material e espiritual.

Os três pólos constituintes do Homem ou Trimembração

Quando contemplamos o corpo humano, podemos perceber três partes bem distintas: cabeça, tronco e membros. Por detrás dessa aparente simplicidade esconde-se, no entanto, um dos grandes segredos da arte antroposófica de curar. Para um médico antroposófico, o ser humano é um organismo trimembrado. Se aprofundarmos nessa direção, ao observarmos a cabeça vemos que nela predominam os processos neurossensoriais. Se observarmos o cérebro, vemos uma estrutura de baixíssima vitalidade e alta especialização. Através da cabeça, a maioria dos estímulos sensoriais penetra no cérebro por meio dos pares cranianos. Outra característica da cabeça é que os seus ossos têm formas planas e arredondadas situando-se na periferia, protegendo o cérebro. No pólo oposto encontram-se o abdómen e os membros, predominando uma intensa actividade metabólica onde os processos de regeneração celular são muito activos e onde há um "ir para o mundo" tanto através das mãos e dos pés como dos resíduos que eliminamos. Os ossos, nesse pólo, são longos e rectilíneos e encontram-se protegidos pela musculatura, dando-lhes sustentação. Entre essas duas regiões de características tão distintas encontra-se o tórax que, na Medicina Antroposófica, abriga o equilíbrio entre as polaridades descritas, sendo a sede do sistema rítmico, que promove a inter-relação saudável entre o pólo neurossensorial e o pólo metabólico. Aí encontram-se órgãos rítmicos: coração e pulmão, protegidos por um arcabouço, as costelas, que também se movimentam. E assim, resumidamente, temos um homem trimembrado nos seus sistemas neurossensorial, rítmico e metabólico. Mas também cada região possui a sua trimembração específica. Na vida psíquica, essa trimembração pode ser identificada nas três actuações básicas: pensar, sentir e agir.

Os Quatro Elementos Constituintes do Ser Humano ou Quadrimembração

"O homem é o que ele é através do corpo físico, do corpo etérico, do corpo astral (alma) e do Eu (espírito). Ele deve ser visto como homem sadio a partir desses membros; ele deve ser percebido, quando doente, no equilíbrio perturbado deles; para a sua saúde devem ser encontrados medicamentos que restabeleçam o equilíbrio perturbado".

Elementos Fundamentais para uma Ampliação da Arte de Curar Rudolf Steiner e Ita Wegman

Uma das maneiras de apresentar o homem à luz da Antroposofia é relacionando-a com a natureza à sua volta. Nessa abordagem, o homem é visto como um ser que compartilha semelhanças com os reinos mineral, vegetal e animal mas que também se distingue deles pela presença da sua autoconsciência. Podemos dizer que o homem guarda em si todos esses reinos, sendo portador de quatro estruturas essenciais, de quatro elementos constituintes, também chamados de "corpos" no jargão médico-antroposófico.

Corpo físico: estrutura sólida, material, palpável e mensurável, sujeita às leis da física e da química. É o corpo que compartilhamos com os minerais. É uma estrutura totalmente inerte e morta quando não permeada pelo segundo elemento (corpo etérico).

Corpo Etérico ou Vital: forças responsáveis por todo o princípio da vida, seja nos vegetais, animais ou seres humanos. O corpo vital dá-nos a possibilidade de desenvolvermos a vida vegetativa: crescimento, regeneração e reprodução.

Corpo Astral (corpo anímico ou alma): forças da consciência, presentes nos reinos animal e humano, que formam o fundamento para uma vida sensitiva. Tem um papel de "organizador" dos processos vitais e, de maneira didática, podemos dizer que se manifesta como sistema nervoso e vida psíquica.

Organização do Eu (espírito): elemento característico do ser humano, que o distingue dos demais reinos e seres da natureza. É responsável pela actuação saudável dos demais corpos e pelo aparecimento do andar erecto, da fala e do pensar. É a nossa individualidade, a nossa entidade espiritual. Relaciona-se com os processos de calor no âmbito do organismo.

Pode fazer-se uma analogia com os quatro elementos alquímicos: terra (corpo físico), água (corpo etérico), ar (corpo astral) e fogo (Eu).

As etapas do desenvolvimento Humano ou Biografia Humana

Uma das grandes contribuições da Antroposofia para a Medicina e a Psicologia é o aprofundamento do estudo das leis biográficas. Se observarmos o ser humano no seu processo de desenvolvimento, veremos que este se dá em ciclos de sete anos, marcados por acontecimentos significativos no campo biológico ou psicológico. Do nascimento até aos sete anos de idade assistimos a profundas transformações relacionadas com o crescimento e o desenvolvimento neuropsicomotor.

O bebé transforma-se numa criança com pensar lógico, sentimentos, vontade própria e muita agilidade. A mudança da dentição e o início da alfabetização, por volta dos sete anos, marcam essa mudança de ciclo. Aos quatorze anos, a maioria dos jovens atingiu a puberdade, marcando um amadurecimento biológico e, aos 21 anos, procuram geralmente a independência da sua família, tendo já alcançado a maioridade jurídica. E assim, a alma humana vai transformando-se juntamente com o seu corpo físico-biológico, à medida que o Eu, a individualidade, se vai aprofundando no seu caminho pela Terra. De maneira mais resumida, assistimos a três grandes marcos biográficos: do nascimento até aos 21 anos; dos 21 até aos 42 anos; dos 42 até aos 63 anos/final da vida. Cada um desses ciclos pode ser dividido em três septénios com características muito definidas. Mas, num olhar abrangente sobre o ciclo de vida humana, vemos um início de vida com muita vitalidade física e pouca consciência; depois um período com maior desenvolvimento emocional e uma "apropriação do mundo", seguido normalmente por uma fase de maturidade, sabedoria e desenvolvimento de consciência social, mas com baixa vitalidade. No fim da vida há um "desprender-se do mundo".

Segundo a Antroposofia, o Eu humano tem uma trajectória encarnatória, descendendo dos mundos espirituais onde tem origem, do nascimento até metade da vida (por volta dos 42 anos), quando esse processo chega ao fim. Logo a seguir começa a sua trajectória de volta aos mundos espirituais, caracterizando-se por uma trajectória excarnatória, um processo ascendente. Entre esses acontecimentos, o Eu humano desenvolve uma história individual, única: a sua biografia. Compreender o processo de saúde e de doença significa compreender o momento biográfico, as suas crises e os seus frutos.

Rudolf Steiner (1861-1925)


Rudolf Steiner foi um filósofo que nasceu dentro das fronteiras do antigo Império Austro-Húngaro, em 1861. No âmbito da multiplicidade de áreas com que a filosofia se ocupa, dedicou-se centralmente à 'Teoria do Conhecimento', uma área que na sua época ocupava intensamente os filósofos europeus e também os cientistas, em função do valor que tinham, em termos de conhecimentos objectivos e os desenvolvimentos que estavam a acontecer, principalmente na campo da física.

Para Rudolf Steiner e outros pensadores da sua época era um conflito ver como a 'Teoria do Conhecimento' se identificava com uma imagem científica do mundo, quando esta, por sua vez, se identificava com a imagem que a física fazia do mundo. Mas acaso essa imagem é válida para a biologia? Essa pergunta levou Steiner a procurar directamente as personalidades que sobressaíam no campo da pesquisa em biologia, tentando encontrar aí os elementos que o levassem a reconhecer, ou não, uma especialização na Teoria do Conhecimento, quando esta era aplicada aos fenómenos dos organismos vivos.

Rudolf Steiner reconheceu essa diferenciação na metodologia proposta pela Teoria do Conhecimento na forma como o poeta alemão Johann Wolfgang von Goethe fazia as suas pesquisas no campo da botánica e da zoologia. A sua primeira tarefa foi publicar a Obra Científica de Goethe, o que ninguém tinha feito até então. Foi ordenando e publicando essa obra em que Rudolf Steiner desenvolveu os primeiros conceitos de uma metodologia específica na Teoria do Conhecimento para se entenderem os organismos vivos. A partir desses trabalhos metodológicos iniciais, durante o século XX, diversas personalidades do mundo científico tentaram aplicar essa metodologia na prática da pesquisa científica, o que levou a um desenvolvimento extraordinário em determinadas áreas da biologia e, consequentemente, à aplicação desses métodos, dentro do possível, também na medicina.

Ita Wegman (1876 - 1943)


Ita Wegman nasceu em Java, Holanda. Fez os seus estudos de medicina na Suíça, formando-se em 1911. Em 1917 conclui a sua especialização em Ginecologia. Foi a personalidade que ajudou a introduzir os trabalhos de Rudolf Steiner na medicina, com o objectivo de ampliar o método científico. No ano de 1917 começa a usar um medicamento elaborado a partir de uma planta, Viscum album, no tratamento de pacientes com neoplasias malignas, exactamente a partir dos conceitos ampliados pela Medicina Antroposófica.

Em 1921 funda a primeira clínica onde se pratica essa medicina ampliada, na cidade de Arlesheim, perto de Basiléia, na Suíça. A partir de 1923 escreve, em conjunto com Rudolf Steiner, um livro fundamental para a Medicina Antroposófica e cuja primeira edição foi publicada após da morte deste. Em 1925 funda uma Escola de Enfermagem e, em 1926, publica a primeira revista de Medicina Antroposófica: a Revista Natura. Em 1931 abre o Centro de Estudos Médicos em Berlim e funda o Instituto de Pedagogia Curativa em Hamborn, também na Alemanha. Em 1932 abre um Centro de Estudos Médicos em Londres.

Em 1936-1937 funda a 'Casa de Cura Andréa Cristóforo' em Ascona, Suíça - uma instituição dedicada a pessoas convalescentes ou que procuravam um local para se restabelecerem -, e o Instituto La Motta, em Brissago, Suíça, para crianças excepcionais. Em 1936 Ita Wegman abre uma Escola de Pedagogia Curativa em Paris. Visitou quase todos os países da Europa, levando sempre o estímulo para o desenvolvimento de iniciativas que fossem portadoras dos impulsos terapêuticos ligados à Medicina Antroposófica. Esta intensa atividade apenas foi interrompida com o início da Segunda Guerra Mundial, quando o nazismo proibiu qualquer atividade ligada à Antroposofia, tanto na Alemanha como nos países ocupados pelos nazis, extinguindo qualquer atividade antroposófica nesses locais.

Ita Wegman foi uma pessoa com enorme capacidade de acção e uma grande universalidade de espírito. Médicos jovens e estudantes de medicina viam nela um modelo a ser imitado no relacionamento médico-paciente. Os seus estudantes interrogaram-na sobre a humanização da medicina e, com essa pergunta, dirigiu-se a Rudolf Steiner, iniciando-se assim um trabalho conjunto, cujo fruto é o que hoje conhecemos como Medicina Antroposófica.